O Casamento de Oseias
O sétimo mandamento ordena: “Não adulterarás” (Êx 20:14).
Contudo, Deus ordenou ao profeta Oseias: “Vai, toma uma mulher de
prostituições. [...] Foi-se, pois, e tomou a Gômer, filha de Diblaim, e ela
concebeu e lhe deu um filho” (Os 1:2, 3). No capítulo 3, verso 1, Deus repetiu
a ordem: “Vai outra vez, ama uma mulher, amada de seu amigo, e adúltera.” Como
entender essas ordens divinas?
Muito se tem debatido e escrito sobre o casamento (ou casamentos)
do profeta Oseias. Eis algumas hipóteses:
1. A história do casamento desse profeta não teria
acontecido realmente, mas foi tudo fruto de uma visão (citando, em apoio,
Oseias 1:1, 2). Em visão, ele teria se casado, gerado dois filhos e uma filha,
a mulher dele o teria traído, etc., e, ao sair dessa visão, teria continuado
solteiro e sem filhos, como antes. O problema com essa hipótese é que nada no
texto sugere tratar-se de uma visão. Ao contrário, parece ser história real,
literal.
2. A história do casamento desse profeta não teria acontecido
realmente, mas é uma lenda (citando, em apoio, Oseias 14:9). Ou seja, alguém a
teria inventado para mostrar o grande amor de Deus por Israel, mesmo estando
esse povo em pecado e em profunda apostasia. Mas nada no texto sugere tratar-se
de uma lenda. Ao contrário, parece ser história real, literal.
3. Gômer teria sido moça direita, mas filha de prostituta (citando,
em apoio, a expressão “mulher de prostituição”, em Oseias 1:2, a qual deveria
ser entendida como “mulher, filha de uma prostituta”). Mas Gômer acabara se
prostituindo (conforme Oseias 2:5), imitando, assim, a mãe dela. Quem defende
essa hipótese, consegue livrar-se do incômodo da ordem divina para que o
profeta tomasse “uma mulher de prostituições” (Os 1:2).
4. Gômer teria sido prostituta e Deus teria ordenado ao profeta
Oseias que se casasse com ela (citando em apoio Oseias 1:2, verso em que é
ordenado ao profeta que se casasse com “uma mulher de prostituições”, acostumada
com muitos “amantes”, conforme Oseias 2:7, 10, 12, 13).
Bem, como há pelo menos quatro hipóteses, escolho essa quarta,
a qual parece fazer mais justiça ao texto bíblico (sem desmerecer quem opta por
uma das três primeiras).
O fato é que, às vezes, Deus dava ordens intrigantes a Seus
profetas: a Isaías foi dito que andasse “despido e descalço” por três anos (Is
20:2, 3), como andavam despidos e descalços os prisioneiros egípcios e etíopes.
A Ezequiel foi ordenado que preparasse sua comida usando fezes humanas (Ez
4:12), sinal para os cativos de Judá, os quais, em terra estrangeira, comeriam
coisas imundas. E ao profeta Oseias teria sido ordenado que se casasse com uma
prostituta (Os 1:2).
Essa ordem ao profeta Oseias não indica que Deus apoie a
prostituição ou o adultério, mas sim, que Ele perdoa a vida passada e dá nova
chance ao pecador, se este se arrepender e mudar de vida. Essa teria sido a
razão para dar uma ordem tão estranha ao profeta. Gômer devia ser grata a ele pela
chance de abandonar a velha vida (Os 2:2) e passar a viver decentemente,
desfrutando do amor incondicional do marido e do carinho e amor dos filhos (parece
que somente o primeiro era filho de Oseias, conforme indica o pronome “lhe”, na
expressão “ela concebeu e lhe deu um filho”, em 1:3, pronome ausente em relação
aos outros dois, conforme Oseias 1:6, 8).
Resta, ainda, a questão da segunda ordem divina ao profeta:
“Vai outra vez, ama uma mulher, amada do seu amigo e adúltera” (Os 3:1). Uns
entendem que essa seria outra mulher. Outros (entre os quais me incluo) pensam
que se trata de Gômer, a mesma mulher do primeiro capítulo de Oseias, prostituta
a quem foi dada a chance de ser amada de verdade e de ter um lar, mas que não
correspondeu. Se esse entendimento está correto, então o amor do profeta Oseias
pela esposa adúltera fica ainda mais evidente. Gômer teria traído o marido,
tido dois filhos fora do casamento e, finalmente, deixado o lar para viver com
muitos amantes, sendo que o último a vendeu, indo ela parar em um mercado de
escravos. O profeta, que nunca a esquecera, soube que sua ex-esposa estava à
venda. E o que fez? Foi rapidamente ao local e pagou o preço cobrado por um
escravo, resgatando-a daquela situação infeliz e vexatória. Ele não tinha todo
o valor em espécie (30 peças de prata), mas nem por isso desistiu: pagou metade
em dinheiro e a outra metade com cereais (3:2).
Que amor maravilhoso e incondicional o profeta demonstrou
para com sua ex-esposa! Ele a quis novamente. Deu-lhe nova chance. Não é assim
que Deus faz conosco? Ele nos aceita como somos – pecaminosos e imperfeitos.
Quando erramos e O abandonamos, nem por isso deixa de amar-nos! Quando estávamos
escravizados pelo pecado, Ele nos resgatou com algo muito mais valioso do que
prata e ouro: o sangue de Seu amado Filho, Jesus Cristo (1Pe 1:18, 19). Será
que Gômer aproveitou a segunda chance dada pelo marido? Não sabemos. Tomara que
sim! O que sabemos é que você e eu podemos dizer sim a Cristo e corresponder a
Seu amor com nosso amor.
Faremos isso?
Por Ozeas C. Moura,
doutor em Teologia Bíblica e professor no Unasp, Campus Engenheiro Coelho, SP.
* Extraido da Revista Adventista Abril de 2013
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